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Uma contemplação daquilo que é vivo, das coisas diminutas, de tudo o que é facilmente ignorado e sobrepujado nas dinâmicas de uma grande metrópole, a não ser que sirva de ornamento para o deleite de uma aristocracia sedenta por uma ambientação que a leve pelo caminho norte do Atlântico.

Raul Leal investiga as espécies que habitaram e ainda habitam o Passeio Público desde sua inauguração, considerando principalmente a transformação realizada por Glaziou, que substitui as linhas retas de Valentim para evocar um selvagem controlado, projetando um romantismo em curvas sinuosas que trata como ornamento a fauna e a flora nativas e exóticas. No entanto, é justamente nos momentos de desatenção que a natureza reivindica sua agência e recusa as propostas decorativas e civilizatórias. Nos períodos de abandono, os bichos da mata atlântica retornam ao que um dia foi seu território e insistem em se manter viva e pulsante.

O fogo da pirografia retrata animais vivos e as cinzas vindas de queimadas criam em monotipias os bichos mortos por eletrocussão ou atropelamento. Sobre a madeira, Leal desenha um ciclo de vida e morte. Além das árvores, são rememorados os tapumes que um dia foram improvisados para substituir os gradis do Passeio no momento da inauguração do jardim de Glaziou, que contrastavam com a exuberância pretendida naquele momento.

Leal pleiteia a atenção para os frangos d’água, gambás, caxinguelês, sapos, cobras e outros seres nativos, encontrando a nobreza das vidas que são negligenciadas por não ornarem com as constantes idealizações de uma cidade cenográfica. 


Raul Leal
Série Do outro lado, 2023
Jibóia
monotipia
80x80cm
Caxinguelê
pirografia
80x80cm
Tillandsia crocata 
monotipia
80x60cm
Xyris jupicai
monotipia
80x60cm
Frango d’água
pirografia
80x80cm
Rãs e aranha
Monotipia e pirografia sobre madeira
80x80cm
Cachorro do mato
monotipia
80x60cm
Gambá
pirografia sobre madeira
80x80cm
Fotos de Tiago Morena.